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Obesidade, inflamação e o risco de Covid-19 grave

Em 2020, o mundo foi forçado a enfrentar duas preocupantes pandemias aparentemente não relacionadas: obesidade e Covid-19, porém, quando sobrepostas, capazes de provocar resultados temerosos. Nesse sentido, Gao et al. ao analisarem 150 pacientes admitidos em três hospitais chineses, constataram que a presença de obesidade estava relacionada com um risco três vezes maior de desenvolvimento da COVID-19 grave. A cada uma unidade de aumento do IMC, observou-se um aumento de 12% no risco para COVID-19 grave.

A associação entre obesidade (ou aumento do IMC) e gravidade da COVID-19 se manteve significante mesmo após ajustes para idade, sexo, tabagismo, hipertensão, diabetes e dislipidemia. Dados chineses de 383 pacientes hospitalizados com COVID-19 entre janeiro e fevereiro foram esquadrinhados por Cai et al. Eles identificaram risco de 1,84 e 3,40 vezes maior de desenvolvimento da COVID-19 grave em pacientes com sobrepeso e obesos, respectivamente, quando comparados aos pacientes com peso normal.

Somado a isso, Kass et al., ao analisaram dados chineses, italianos e estadunidenses, levantaram a hipótese de que a obesidade poderia modificar o perfil de idade acometido pela COVID-19 grave. Antes de chegar nas Américas, a infecção grave por SARS-CoV-2 era enfaticamente relacionada a pessoas mais idosas, passando uma falsa sensação de segurança aos mais jovens. Porém, ao atingir os Estados Unidos, país no qual a obesidade possui prevalência de 40%, diversos pacientes jovens começaram a ser admitidos em unidades de terapia intensiva (UTI).

Em relação aos aspectos fisiopatológicos da obesidade, sabe-se que essa doença favorece, inicialmente, o desenvolvimento da inflamação no tecido adiposo, através do aumento da produção de adipocinas pró-inflamatórias, a exemplo da IL-6 e o TNF-. Desta forma, a proporção entre citocinas pro-inflamatórias e anti-inflamatórias torna-se desbalanceada. Por consequência, ocorrem prejuízos ao sistema vascular, promovendo disfunção endotelial, caracterizada por diminuição na produção de óxido nítrico e aumento na síntese de espécies reativas de oxigênio, o que estabelece um estado inflamatório e de estresse oxidativo.

A obesidade induz ainda, uma modificação no perfil de macrófagos, com aumento do fenótipo M1 (pró-inflamatório).  Todavia, não é apenas no tecido adiposo que ocorre essa alteração, Ghanim et al. demonstraram, que em células do sistema imune inato as células mononucleares circulantes de obesos encontram-se, também, em um estado pró-inflamatório, com o aumento do fator intranuclear κB (NF-κB) e, por consequência, com o aumento da transcrição de genes pro-inflamatórios regulados por ele. Assim, observa-se que a resposta imune inata em pacientes com obesidade encontra-se comprometida, culminando em um desbalanço na linha de defesa contra infecções, no aumento da resposta inflamatória e em ativação anormal dos linfócitos T. Ressalta-se, também, que o aumento primário da resposta inflamatória, próprio da obesidade, pode ser um fator contribuinte para o estado hiper inflamatório observado na COVID-19 grave; esse aumento da resposta anti-inflamatória pode ser amplificado pela infecção viral pelo SARS-CoV-2, elevando a produção de citocinas como TNF-α, IL-1 e IL-6.

Assim, o tecido adiposo se transforma em um alvo e em um reservatório viral em potencial. Em suma, a obesidade é uma patologia que provoca prejuízo ao sistema imune e amplifica as respostas inflamatórias. Além disso, os adipócitos podem servir como reservatório viral. Esses fatores contribuem para o entendimento da interação maléfica da COVID-19 com a obesidade.

Gao F, Zheng KI, Wang X-B, Sun Q-F, Pan K-H, Wang T-Y, et al. Obesity is a Risk Factor for Greater COVID-19 Severity. Diabetes Care [Preprint] [Internet]. 14 maio de 2020.

Ghanim H, Aljada A, Hofmeyer D, Syed T, Mohanty P, Dandona P. Circulating Mononuclear Cells in the Obese Are in a Proinflammatory State. Circulation [Internet]. 21 set 2004

Kass DA, Duggal P, Cingolani O. Obesity could shift severe COVID-19 disease to younger ages. Lancet [Internet]. 30 abr 2020 [capturado 8 jun 2020]; 395(10236):1544-1545

FONTE: LIVRO- OBESIDADE E RISCO DA COVID- 19, GRAVE.

About Dra. Elba Lúcia Wanderley dos Santos

Médica com título de especialista em Ginecologia-obstetrícia, acupuntura, homeopatia e clínica de dor, mestre em Ciências Médico cirúrgica pela Universidade Federal do Ceará, coordenadora do ambulatório de acupuntura do HC-UFPE, Preceptora da residência em acupuntura do HC-UFPE, docente da cadeira Bases do Tratamento da dor da UFPE e docente da cadeira de acupuntura da UFPE.